Despertamos para uma inesperada aurora chuvosa.
Da beira de estrada em que a admiramos, o sol eleva-se atrás de uma árvore com ramagem ampla mas fina a que a luz faz destacar os mais ínfimos detalhes. Nasce em conflito com uma nuvem ampla e carregada.
Aos poucos, os seus tentáculos ondulantes de água capturam-no e escurecem o dourado. A chuva dança sobre a Terra. Abençoa a savana ressequida com mais vida do que a savana tem.
Se estivéssemos no Botswana, a chuva caía enquanto “pula”, a coisa mais valiosa desta nação do Kalahari.
De tal maneira preciosa que assim se denomina a moeda nacional e o fenómeno ilustra as suas notas.
O Botswana fica logo ao lado, a oriente. A fronteira sul de Angola, está bem mais próxima, antecedida por uma constelação de povoações que, por alguma razão terrena, têm nomes começados por Ó.
Ó de Oshivelo, de Omuthiya, de Ondangawa, de Oshakati, de Ongwediva, de Oshikango, de Okathima, de Oukahao e de Outapi, para mencionar uns poucos.
Para que não fiquem dúvidas da apetência da Namíbia para terras assim começadas, saiba ainda que as três províncias em redor da Kunene que desbravávamos eram Oshana, Oshikoto e Otjozondjupa.
Tínhamos subido ao cimo da Namíbia determinados a, entre outros, ficarmos a conhecer o seu “Grande Lugar Branco”. Assim que a chuva e o áureo da alta madrugada se desvanecem, o Parque Nacional Etosha recupera a sua alvura.
Parque Nacional Etosha: a Grande Namíbia Branca e Salgada
Damos entrada no reduto imenso do parque homónimo. Assim que perscrutamos a paisagem, avistamos um casal de avestruzes, de bicos a sondar o solo e, a espaços, em modo de periscópios de criaturas desconfiadas.
Nas imediações, um dos muitos chacais-de-dorso-negro que habitam as redondezas observa as aves, desmotivado por não figurarem no cardápio da sua espécie.
Na direcção oposta, as expectativas revelam-se ainda mais parcas. Duas girafas adultas destacam-se acima da forragem espinhosa.
De tal maneira altas e espadaúdas que, para se alimentarem, dobra o pescoço exagerado.
Adequada à época, a pluviosidade tinha feito germinar vegetação há meses rendida ao calor.
O verde do ervado selvagem e o amarelo do feno, disfarçavam a aridez e crueza do cenário. Os chifres aguçados e os corpos espartanos de alguns órix destacava-se desse pasto aveludado.
À medida que nos acercávamos do âmago do Parque Nacional Etosha, já nem a chuva fazia milagres.
Aos poucos, Etosha tornava-se a grande planície de sal que recorta o mapa da Namíbia.
Estradas de Sal Cruzadas pelos Animais
Continuamos pela estrada de solo compactado e níveo. A certo ponto, confrontamo-nos com um grupo de zebras que barram a passagem e que, não só não arredam pé, como parecem querer conviver com os passageiros dos carros.
Um desses visitantes ignora as regras. E um mínimo bom senso.
Abre a porta do condutor, acocora-se sobre a berma vegetada e fotografa as zebras. Em vários outros casos de semelhante incúria, em distintas paragens, leões, tigres e predadores afins não perdoaram. A sorte e a probabilidade estiveram do seu lado.
Chegamos a um ponto de observação numa ramificação sem saída, à sombra de uma grande acácia disputada por corvídeos.
Ali, em jeito de marco geodésico, um aviso escrito a vermelho sobre cimento branco relembrava os mais tentados a sair para uma contemplação arejada: “Stay in your car”.
Assim fazemos. Mesmo que, por diante, a visão do Etosha apenas salgado e sem fim, clamasse por inconsciência.
Etosha: um Salar gerado pela Dispersão do Rio Cunene
O salar principal de Etosha tem uns, nada módicos, 130km por 50km. Ocupa mais de 20% da área total do Parque Nacional Etosha e é distinguível do Espaço.
É, ainda, a secção mais profunda do parque, se bem que situada entre os 1071m e os 1086m acima do nível do mar.
O salar de Etosha formou-se durante o Plioceno.
Surgiu de um processo de dispersão do alto rio Cunene e, eventualmente, também do Cubango, para sul que geraram um lago interior e um pântano, semelhantes ao Delta do rio Okavango (Cubango).
Mais tarde, o fluxo do Cunene desviou-se de sul para oeste, na direcção do Atlântico. As altas temperaturas e a insuficiência de chuva fizeram o lago encolher. Até restar argila e o sal contido na água.
O visual aparentemente estéril do salar leva ao engano de se pensar que os animais da savana circundante o evitam. Na realidade, como temos a fortuna de constatar, a sua hipersalinidade é apreciada por várias espécies.
A Distinta Relação das Espécies com a Chuva e a Seca
Após a época das chuvas (Dezembro a Março), quando diversos canais fluem de Angola para sul, o salar fica por algum tempo coberto de água. Nesse período, habitam-no flamingos e pelicanos. Quando a água volta a drenar, deixa a descoberto secções de lama ou de blocos salgados.
O único animal que se embrenha no interior do Etosha é a avestruz que lá encontra lugares de nidificação por que nenhum predador dos seus ovos se aventura.
Nas orlas, com a vegetação à vista, constatamos manadas de zebras e de gnus. Outras espécies de grande porte habituaram-se a lamber a lama e os blocos salgados de maneira a se suplementarem de minerais.
Etosha poderá também significar “Lugar das Miragens”. A fauna que interage em redor do salar é tão real como deslumbrante.
Conta com uma das maiores concentrações de grandes animais à face da Terra.
São elefantes, rinocerontes, elandes, órix, zebras, gnus, leões, hienas e girafas de subespécie angolana, entre outros.
Tanto as espécies como o número de espécimes podiam ser mais.
Parque Nacional Etosha e a sua Vastidão nem sempre Protegida
No final do século XIX, os elefantes – à imagem dos rinocerontes, leões e outros animais de grande porte, estavam quase extintos. O governo colonial alemão da África do Sudoeste reagiu e criou uma reserva animal.
Daí em diante, quase todas as espécies recuperaram.
O território hoje namibiano pertencia já à África do Sul quando, em 1967, as autoridades decretaram Etosha parque nacional. Etosha parecia ter um futuro promissor.
Mas, tal como aconteceu (por exemplo) no PN Gorongosa, de Moçambique e em distintos parques de vida selvagem de Angola, durante as guerras civis de ambos os países, a Guerra de Independência da Namíbia (1966-88), levou a que, tanto a força de guerrilha SWAPO (Organização do Povo do Sudoeste Africano), como as tropas sul-africanas que a combatiam, tenham abatido boa parte dos animais de grande porte.
Daí para cá, algumas das espécies voltaram a recuperar. Outras nem por isso. Temos a sorte de avistar um dos animais emblemáticos e em maior perigo de extinção, o rinoceronte-negro.
O espécime que admiramos caminha solitário duas centenas de metros atrás de uma pequena manada de gnus, dourada pelo sol poente.
Por forma a não atrair caçadores furtivos, as autoridades optam por não revelar qual o total de rinocerontes-negros do parque.
Estima-se, todavia, que só em 2022, na ressaca da pandemia, tenham sido abatidos quarenta e seis dos rinocerontes de Etosha.
O motivo permanece o mesmo. A veneração de países do Oriente (a populosa China à cabeça) do corno do animal, pelas suas alegadas propriedades medicinais e do seu uso em peças de joalharia.
Os elefantes, ao invés, são comuns em Etosha e num número bem superior.
De tal maneira, que acontece, amiúde, e nos aconteceu a nós, as suas deambulações pelas estradas condicionarem o trânsito de visitantes do parque.
Porque lhes bloqueiam a passagem.
E porque estes seguem os paquidermes determinados a deles conseguirem boas imagens.
Alguns visitantes, menos cautos ou hábeis ao volante, chegam a ver-se em apuros.
As Lagoas e Charcos Cruciais que as Autoridades têm que Manter
Com a tarde a caminhar para o fim e a temperatura ainda elevada, os animais ressentem-se. Avançamos para próximo da entrada que tínhamos usado de manhã cedo.
Nas imediações, damos com um lago de acesso algo pedregoso. Ainda estamos a estacionar quando uma longa manada de zebras se aproxima.
Aos poucos, enfia-se na água livre de crocodilos e enche o lago de um listado quase hipnótico.
Esperamos, atentos, à aparição de predadores, de leões ou leopardos, já que as chitas são apenas umas poucas.
Não aparecem nem predadores, nem gnus, que têm o hábito de aderir às rotinas das zebras.
A água satisfaz-lhes a sede comunal. Em seguida, vemo-las debandarem rumo ao coração do parque.
Para mais perto do branco e do sal, o composto ora temido, ora ansiado que faz do Parque Nacional Etosha um habitat e ecossistema especial.
FICHA DE DESTINO
1 – Windhoek
2 – PN Etosha
COMO IR
TAAG – Linhas Aéreas de Angola: Voo Lisboa – Luanda – Windhoek (Namíbia) em TAAG: www.taag.com por a partir de 750€.
Reserve o seu programa de viagem na Namíbia com a Lark Journeys: www.larkjourneys.com Whats App: +264 81 209 47 83
FB e Instagram: Lark.Journeys