Por fim, deixamos o abrigo cristão da capela de Alto Vista.
Descemos, entre cactos e, aqui e ali, burros errantes, para sudeste de Aruba. Progredimos, na diagonal, fiéis à posição que a ilha ocupa no limiar sul do Mar das Caraíbas. Jonathan, o guia local, toma a estrada de terra que se faz à costa oriental.
Se já no cimo da capela o vento soprava forte, por ali, a meias com o oceano, os Alísios castigavam a paisagem árida sem misericórdia. Atingimos a quase orla.
Compõe-na uma laje rochosa coberta de areia prensada. Na zona batida pelas vagas, dá lugar a mera rocha, a grandes recifes e blocos escuros e rugosos que tornam o litoral arubense leste um quebra-cabeças balnear.
A espaços, essa orla revela quebras. Fracturas geológicas e de erosão que o mar converte em areais afundados face à costa. No caminho, damos com uma primeira. Logo, com várias mais. Umas, são verdadeiras praias. Outras, enseadas rectilíneas preenchidas com calhaus polidos.
A de Klif concede-nos um primeiro exemplo de como os Alísios enfurecem o Mar das Caraíbas.
A Excentricidade de Dioríto e Cactos da Ayo Rocks Formation
Continuamos. Jonathan interrompe a viagem face a uma pilha de grandes rochedos alisados e empilhados. Estávamos perante a Ayo Rock Formation, outro monumento geológico excêntrico de Aruba.
Cactos multiplicados impunham-se por entre as pedras e, assim ditava a ilusão, pareciam delas despontar, apontados ao céu azulão. Grandes cabras reinavam neste domínio lítico e abrolhoso.
Umas poucas, deitadas a refrescarem-se ao vento com que a ligeira sobranceria as prendava.
Outras, irrequietas, a saltarem de rocha em rocha e, apesar da ameaça perfurante dos cactos, a confrontarem-se num equilíbrio precário, com sucessivas marradas.
Os caprinos residentes de Ayo descendem dos trazidos para a ilha pelos seus primeiros colonos, neste caso, os espanhóis que, ainda no século XV, liderados pelo castelhano Alonso de Ojeda, a reclamaram e ocuparam.
A formação de Ayo esconde, no entanto, indícios de uma presença prévia.
Os Conquistadores Castelhanos e os Indígenas Caquetios
À chegada dos espanhóis, os donos de Aruba eram os indígenas Caquetíos, que migraram para a ilha do litoral iminente da actual Venezuela. Estes, impressionaram de tal forma os Conquistadores com a sua altura que os espanhóis apodaram a ilha de “isla de gigantes”.
Os Caquetíos tinham por hábito usarem as rochas, suas reentrâncias e concavidades como abrigo das tempestades que de tempos a tempos fustigavam a ilha.
Da sua presença e, estima-se, de distintos ritos ali celebrados, resultou uma profusão de petróglifos que a abundância de linhas circulares e curvas, brancas e vermelhas torna característicos.
Havia uma outra forte razão para tanto os Caquetíos, os colonos que se sucederam e até as cabras frequentarem as Ayo: o privilégio panorâmico do topo da formação.
Ainda hoje, nos dias de atmosfera límpida, as Ayo permitem apreciar toda a Aruba em volta e até vislumbrar a costa norte da Venezuela, sobretudo a mais próxima da Península de Paraguaná.
A Caminho do Sul e do PN Arikok
Prosseguimos para sul. Às tantas, já pelo meio do casario rural que ocupa uma zona ainda arável e habitável de Aruba, com passagem por Santa Lucia, Angochi e San Fuego.
Nesta última povoação, deixamos a route 6 para a perpendicular 7, apontada ao destino primordial do dia.
Para oriente de San Fuego, aos poucos, o casario e os edifícios dão lugar a um terreno enrugado e ermo, sulcado por talvegues que as raras chuvadas aprofundam.
A route 7 submete-nos a um pórtico do PN Arikok. Conduz-nos para o âmago dessa que é a maior área protegida da ilha, quase um quinto da área total de Aruba.
Detemo-nos junto a outra das fracturas geológicas que delimitam praias embrenhadas.
As vagas poderosas que invadem o areal formam turbilhões. Em dias de ventania de nordeste, tornam os banhos arriscados.
A Boca Prins, entre as Várias Bocas do Leste de Aruba
No seu fascinante dialecto papiamento, os arubanos há muito que chamam a estas reentrâncias marinhas caprichosas de “boca”.
A que nos entretemos a explorar, acima e abaixo das suas falésias, era conhecida como Boca Prins, estima-se que em função do nome de colonos holandeses que por ali geraram um dos coqueirais mais antigos da ilha.
Perante a proibição de se refrescar na água, um casal aproxima-se da beira de uma falésia côncava, exposto às rajadas furibundas, num ponto avançado e algo arriscado em que as linhas das vagas e os novelos difusos de nuvens se pareciam intersectar.
A Boca Prins provou-se apenas um dos lugares em que a ventania inviabilizava os banhos. Uns poucos quilómetros a norte, até mesmo as piscinas naturais de Conchi, formadas por uma aglomeração volumosa de rochedos, se mantinha à mercê das enormes ondas.
Por motivos distintos, voltamos a flectir para o interior. Não muito. A determinada altura, a Route 7 avança entre camadas geológicas desniveladas. Uma, inicial, sobranceira ao mar e uma outra legada de uma era em que o oceano chegava umas centenas de metros mais acima na ilha.
Abandonamos a via.
À Descoberta das Grutas de Quadiriki
Para um trilho arenoso que nos deixa de frente para novas falésias de calcário, em tempos cavadas pelo oceano e pela erosão.
É a razão porque, quando exploramos as suas grutas conhecidas por Quadiriki, constatamos uma profusão de aberturas no tecto.
Geram feixes de luz solar que ofuscam os visitantes, como nós, depressa rendidos aos estudos fotográficos, a meras fotos e – claro está – às selfies que os tais holofotes inspiram.
A maior das grutas de Quadiriki estende-se por 150 metros, divididos por três câmaras.
Encontramos as duas primeiras clareadas pela inusitada iluminação.
Já a última, tem o cimo fechado. A sua escuridão serve de abrigo a colónias de morcegos que lá depositam guano.
Uma gruta desviada e mais diminuta, conhecida como Fontein, prova que, à parte dos morcegos e dos pequenos répteis, também os indígenas as chegaram a habitar.
Preserva um sortido de petróglifos que complementa os da Ayo Rocks Formation.
O parque de Arikok termina alguns quilómetros para sul, onde o portal de Vader Piet faz da sua entrada meridional.
O nome Arikok que lhe confere profundidade histórica, vem do engenho e da persistência de um dos colonos holandeses que deixaram a Europa e se enraizaram na terra desafiante de Aruba.
PN Arikok: em Homenagem do Colono e Fazendeiro Holandês Arie Kok
Arie Kok, o colono epónimo, achou um nicho para a sua vida numa zona arável dentro dos actuais limites do parque nacional. Lá se instalou, estima-se que no século XVIII, numa cas di torto (dialecto papiamento para casa de adobe) que construiu, em adobe, pedras de coral e caliche, no estilo campestre que os arubanos classificam como cunucu.
Arie Kok ergueu-a no âmago de um jardim com plantas de Aruba catalogadas, envolta de cultivos de tudo um pouco o que o solo da ilha fazia germinar.
Da sua casa pouco sobrava quando as autoridades de Aruba decidiram fundar o parque. Ainda assim, reergueram uma casa-museu alva inspirada na original.
Boa parte do legado de Arie Kok perdeu-se numa falta de registos de que são excepção velhos mapas que sinalizam a sua propriedade.
O nome do colono isolado e aventurado perdura, eternizado num dos mais deslumbrantes parques nacionais do Caribe.
COMO IR
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