Estendido por quase 30km, o vale de Ezulwini é o coração e a alma da velha Suazilândia. Lá se situa Lobamba, a capital tradicional e assento da monarquia, a pouca distância da capital de facto, Mbabane. Verdejante e panorâmico, profundamente histórico e cultural, o vale mantém-se ainda o cerne turístico do reino de eSwatini.
Texto: Marco C. Pereira
Imagens: Marco C. Pereira-Sara Wong
Estamos no fim de Fevereiro e a mais de mil metros de altitude.
Pela altura do ano, o Estio destas paragens já devia ter começado a baquear. Em vez, o Domingo desperta morno.
Numas poucas horas, devolve Mantenga, o vale de Ezulwini e a maior parte de eSwatini à estufa meteorológica que, assim nos afiançam distintos anfitriões, já se arrasta há uns dias.
Subimos até à varanda de madeira e estação de refeições desafogada do Mantenga Lodge.
Envolve-a uma floresta tropical que as chuvas fulminantes do fim de tarde e o rio Lusushwana irrigam quase em permanência.
Oposto àquela meia-encosta luxuriante, destaca-se um cabeço granítico que umas poucas nuvens solitárias parecem desafiar.
Ezulwini, a Montanha de Nyonyane e a Execution Rock
De visual dramático, conhecido como Execution Rock, é um dos picos que coroam Nyonyane, uma montanha há muito associada à realeza suazi e, por motivos díspares, à vida e ao seu fim.
Nos primórdios da região, os bosquímanos usaram grutas e reentrâncias de Nyonyane como abrigos. A sabedoria popular de eSwatini, reiterada, amiúde pelos guias locais, explica o nome do pico.
Noutros tempos de justiça inclemente, os perpetradores de crimes graves, incluindo bruxaria e afins, eram conduzidos ao topo do rochedo e de lá atirados sem apelo.
Em redor, Nyonyane acolhe ainda a realeza suazi falecida. Durante a sua vigência, os membros da família real Dlamini têm aposentos em Ngabezweni.
Uma vez defuntos, são sepultados em grutas das vertentes rochosas de Nyonyane, em áreas consideradas sagradas.
De acordo com Nsesi, um dos nativos que nos guia, o estádio em que se realizam os maiores eventos da nação pode receber quinze mil espectadores. Ficou, no entanto, desprovido de metade da sua estrutura de bancadas. Isto, para que, durante os eventos, os súbditos não virassem as costas à realeza ancestral.
Está longe de ser tudo. Segundo o mesmo guia, quando os súbditos têm necessidade de apontar a montanha de Nyonyane, devem fazê-lo com o dedo dobrado.
eSwatini, ex-Suazilândia: a Derradeira Monarquia Absoluta de África
eSwatini preserva uma realeza secular e o derradeiro monarca absoluto (leia-se não constitucional) de África. Como, em Tonga, subsiste o da vasta Polinésia.
Fundou-a um tal de chefe Mtalatala que conduziu o povo suazi através da actual Tanzânia e de Moçambique até aos domínios em que se radicaram.
A sua antiguidade justifica um sem número de protocolos e mesuras, algumas, à luz dos nossos dias, consideradas excêntricas e que conferem ao reino boa parte do fascínio que desperta.
A Realeza de eSwatini e uma Histórica Poligamia
É, por exemplo, expectável que o rei suazi seja polígamo. Mswati III, tem, nem mais nem menos, que catorze mulheres. E, destas, mais de vinte cinco filhos.
A poligamia está de tal maneira implantada na história de eSwatini que, em 2019, o próprio Mswati III se viu obrigado a desmentir uma acusação tornada viral de que tinha decretado que todos os homens seus súbditos deveriam manter, pelo menos, duas mulheres, ou seriam presos.
Dias depois, cumprimos todo um périplo pela capital real de Lobamba.
Inteiramo-nos de muitas outras particularidades.
Mantenga e a sua Mantenga Cultural Village
Esse dia inaugural e calorento, começamos por dedicá-lo à Mantenga Cultural Village.
Trata-se de uma povoação instalada às margens do rio Lusushwana.
Cumpre a finalidade de exibir aos visitantes os modos de vida tradicionais do povo suazi.
Lá nos serve de anfitrião Paul, assim se apresenta com a sua graça cristã e o cuidado de informar o verdadeiro nome:
Mbuluzi, o mesmo de um rio que flui mais para noroeste da nação, na iminência da fronteira com a África do Sul.
A aldeia agrupa cabanas elementares, protegidas por uma paliçada.
Antes de a percorrermos, Mbuluzi convoca-nos para uma apresentação de danças.
Ia ter lugar no interior de uma cabana comunal bem mais ampla, à sombra e a salvo da fornalha que, entretanto, se tinha intensificado.
As Danças que Espelham o Espírito Aguerrido do Povo Suáti
Lá se apresentam homens e mulheres suazis, os homens de tronco nu, acima de saiotes de pele, adornados ainda por caneleiras e pulseiras felpudas.
As mulheres, trajam as túnicas vermelhas, brancas e negras tradicionais de eSwatini, que vimos, noutras partes e ocasiões, decoradas com a imagem do rei.
Ambos os géneros brandem bastões de madeira e impressionam-nos e aos restantes espectadores com movimentos ora graciosos, ora bélicos e vigorosos que emulam a histórica aptidão suázi para as batalhas e a submissão dos inimigos.
Decorrida mais de meia-hora, comprovado em exibições de dias posteriores, concluímos que, entre uma panóplia de movimentos, se distinguem, nas danças suázis, as sucessivas elevações das pernas acima da cabeça.
Enquanto os dançarinos recuperam do esforço e limpam o suor, Mbuluzi conduz-nos ao interior da paliçada.
Instantes depois, guia-nos de cabana em cabana, cada qual meritória da sua narrativa, algumas, já com a presença dos dançarinos, convertidos em figurantes.
A Casa da Avó e as Cascatas do rio Lusushwana
Mbuluzi despende tempo adicional na denominada casa da avó, presente em todas as aldeias tradicionais de eSwatini e até mesmo nas já erguidas em pedra e materiais modernos.
“Onde quer que seja, em eSwatini, a casa da avó continua a ser vista como o “porto de abrigo” comunal, o lugar onde os membros da família se inteiram das novidades e onde procuram conselhos para momentos de indecisão e dificuldade.
Muitas coisas mudaram e mudam neste reino. Acreditem que o respeito pela casa da avó se mantém na base da nossa forma de ser.”
Mbuluzi preocupa-se ainda em, para lá da aldeia e da componente cultural, nos revelar paisagens incontornáveis que não a Execution Rock.
Cumprida uma viagem de jipe e a pé até à beira do rio, damos com as cascatas de Mantenga e com um bando de javalis-africanos sedentos, ansiosos por se meterem na água.
Por essa altura, o calor atingia o seu ápice. Gerava cumulus nimbus impressionantes que auguravam o dilúvio breve do dia.
Durante todo aquele périplo, tinha-se insinuado, acima, a Execution Rock. Haveríamos de a conquistar, dias mais tarde, a partir de uma vertente oposta de Mlilwane.
Nessa tarde, ainda nos rendemos a uma outra elevação emblemática da nação.
Cruzamos Mbabane, a capital executiva de eSwatini, morada de quase cem mil dos quase 1.3 milhões de súbditos, na sua grande maioria de etnia suázi, sendo que cerca de 15% são Zulus e de outras etnias.
A Monumental Sibebe Rock
De Mbabane, prosseguimos para norte, por um vale comparável ao de Ezulwini, aprofundado pelo tal rio Mbuluzi.
Às tantas, uma enorme falésia de pedra cinzenta-listada destaca-se da planura e das encostas verdejantes.
Por alguma razão, consta nos rótulos da cerveja mais popular do país.
Impressionante como a víamos, com os seus 800 metros de altura, a Sibebe rock define um dos monólitos superlativos de África, promovido, amiúde, como um dos maiores à face da Terra.
Lá tem lugar a competição Sibebe Survivor que envolve a escalada extenuante e, em boa parte, rastejante até ao cimo.
Uma lesão inesperada e o calor abrasivo impedem-nos de a tentarmos. Em vez, dedicamo-nos à cerveja, se bem que não a de Sibebe, a de marula.
Em eSwatini, era, naquela altura do ano, confeccionada e consumida em enormes quantidades. Justificava, até mesmo, todo um festival nacional, celebrado numa exuberante ebriedade.
Por sua culpa, um número substancial de súbditos ziguezagueava, em euforia, por caminhos rectos.
Lobamba: a Capital Real de eSwatini
A nossa introdução à cerveja de marula começou, com relativa pompa e circunstância, por uma visita a Lobamba.
Lobamba é a capital legislativa do Reino de eSwatini, sede do Parlamento, da Aldeia Real de Ludzidzini, a residência da Rainha-Mãe de eSwatini.
E ainda do King Sobhuza II Memorial Park, erguido em honra do rei que conduziu a então Suazilândia à independência do Reino Unido.
Sobhuza II orgulhou-se de ter conseguido a emancipação suazi dos colonos sem conflitos e sem gerar inimigos para a sua nação, a famosa citação “I Have no Enemies”.
Provou-se também o verdadeiro peso-pesado suázi da poligamia, chefe de uma família que se estimava contar com cerca de seiscentos descendentes crianças, supostamente todos de apelido Dlamini.
Finda essa incursão, em jeito de contraponto, Bongani Motsa (grato, no dialecto suáti), o guia designado, propõe-nos visitarmos o bairro em que tinha nascido, Txuluga.
Txuluga e a Prova da Cerveja de Marula
Descobrimo-lo feito de lares e outros edifícios pobres, numa discrepância polémica com o fausto esbanjador, inevitavelmente, gerador de frustração e protesto em que vive a Realeza.
Ironia das ironias: Bongani esclarece-nos que Txuluga também é o bairro de que provinha Sobhuza II, pai falecido da nação e do actual rei Mswati III.
Cirandamos entre casas abarracadas. Saudados com júbilo por sucessivos moradores alcoolizados. “Bom, com tanta pergunta sobre a marula e a cerveja, está na altura de a provarem!”
Seguimos o guia por duas ou três ruelas sinuosas. No fundo de uma delas, um grupo de nativos convive animado pela bebida. Vende-a, ao copo de plástico, uma fornecedora inesperada, Busi Mthembu, uma viúva idosa que se limita a cobrar, mas se mantém à margem da festa.
Provamos a cerveja, sob o esgar gozão dos convivas. Sabe-nos na mesma linha de bebidas artesanais que provámos noutras partes de África, por exemplo, os vinhos de palma e de caju.
Bebericamos um pouco mais, de maneira a justificarmos a aprovação e a atenção de Bongani Motsa. Após o que nos despedimos dos moradores e deixamos Txuluga, antes que a marula fermentada nos vitimasse.
Regressamos a Mantenga só ligeiramente zonzos,
Pelo caminho, uma manada de vacas detém-nos e ao restante trânsito.
Dizem-nos que o gado pertence ao rei Mswati III.
A bátega do dia não tardou a apoderar-se do vale e a refrear os ânimos no reino de eSwatini.
Como Ir
Voe para Mbabane via Maputo, com a TAP Air Portugal: flytap.com/ e a FlyAirlink.
O Chobe marca a divisão entre o Botswana e três dos países vizinhos, a Zâmbia, o Zimbabwé e a Namíbia. Mas o seu leito caprichoso tem uma função bem mais crucial que esta delimitação política.
Aos 5416m de altitude, o desfiladeiro de Thorong La é o grande desafio e o principal causador de ansiedade do itinerário. Depois de, em Outubro de 2014, ter vitimado 29 montanhistas, cruzá-lo em segurança gera um alívio digno de dupla celebração.
Em redor da capital Mérida, para cada velha hacienda henequenera colonial há pelo menos um cenote. Com frequência, coexistem e, como aconteceu com a semi-recuperada Hacienda Mucuyché, em duo, resultam nalguns dos lugares mais sublimes do sudeste mexicano.
Em viagem, acontece vermo-nos confrontados com a falta de tempo para explorar um lugar tão imperdível como elevado. Ditam a medicina e as experiências prévias com o Mal de Altitude que não devemos arriscar subir à pressa.
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Sofreu as piores agruras da Guerra do Vietname e foi desprezada pelos vietcong devido ao passado feudal. As bandeiras nacional-comunistas esvoaçam sobre as suas muralhas mas Hué recupera o esplendor.
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No fim da década de 80, duas multinacionais nipónicas já viam as fotocabines convencionais como peças de museu. Transformaram-nas em máquinas revolucionárias e o Japão rendeu-se ao fenómeno Purikura.
Banidas em grande parte do Primeiro Mundo, as lutas de galos prosperam nas Filipinas onde movem milhões de pessoas e de Pesos. Apesar dos seus eternos problemas é o sabong que mais estimula a nação.
A beleza do Laos e o custo mais baixo são boa razões para navegar entre Chiang Khong e Luang Prabang. Mas esta longa descida do rio Mekong pode ser tão desgastante quanto pitoresca.
O templo Meiji de Tóquio foi erguido para honrar os espíritos deificados de um dos casais mais influentes da história do Japão. Com o passar do tempo, especializou-se em celebrar bodas tradicionais.
A maior parte das fotografias em viagem são tiradas com luz solar. A luz solar e a meteorologia formam uma interacção caprichosa. Saiba como a prever, detectar e usar no seu melhor.
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Estamos a 66º Norte e às portas da Lapónia. Por estes lados, a paisagem branca é de todos e de ninguém como as árvores cobertas de neve, o frio atroz e a noite sem fim.
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Passaram 18 anos desde que nos deslumbrámos com este que é um dos litorais abençoados da Costa Rica. Há apenas dois meses, reencontrámo-lo. Tão aconchegante como o tínhamos conhecido.
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