Já vamos com vários dias de novo périplo pela Namíbia.
A viajarmos de Windhoek para norte, o trajecto que se segue depressa trata de nos esclarecer que nos aproximamos da zona mais remota e selvagem do país, o recanto noroeste da província de Kunene.
Após deixarmos o Twyfelfontein Adventure Camp, ainda desfrutamos, por breves minutos, do asfalto novo e suave que servia a zona, os seus vários lodges e o reduto de arte rupestre de Twyfelfontein, património da Humanidade.
A via em que nos metemos era de categoria C. Na Namíbia, ao mínimo descuido, certas estradas C podem significar Carga de trabalhos. De maneira a não perdermos as horas de melhor luz nem na origem, nem no destino, cumprimos o percurso de 1h30, com o sol a pique.
Twyfelfontein para Trás. Rumo a Palmwag.
Tanto a C39 como a C43 a que dá lugar são de areia e gravilha. Como se não bastasse, sulcam montes e vales, ao sabor do leito seco do rio Springbok, noutro dos cenários áridos, escarpados, para o interior do deserto do Namibe.
Pelo caminho, até o nome das povoações ilustra esta secura.
Passamos Spaarwater. Progredimos já entre dois leitos fluviais, o do Springbok e o de um seu distributário. Na iminência de Palmwag, torna-se óbvia, a razão, sobretudo aquífera, de ser da povoação.
Por acção da gravidade e da erosão, uma depressão geológica concentra ainda mais álveos derivados de um rio efémero principal que nasce um pouco mais a norte, nas montanhas Grootberg.
A passagem do Uniab, renovado pelas sucessivas épocas das chuvas, de Novembro a Abril, dá origem a um oásis de palmeiras-de-leque e outras plantas que inspirou o baptismo da povoação.
Chegamos a um entroncamento. Uma nova via, a C40, flecte para noroeste. Nós, mantemo-nos na C43, sobre um solo de lixa, ora ocre, ora cinza e de tons intermédios que contrasta com o verde à vista.
Umas poucas bancas de pau-a-pique na beira da estrada, expõem minerais coloridos e algum artesanato.
Como acontece com tantas outras disseminadas pela Namíbia, os seus donos estão ausentes. Aparecem de lares humildes, por vezes, distantes, numa correria e berraria, sempre que um carro se detém.
Uma Pausa na Divisória Veterinária da Namíbia
Um portão barra-nos. Estamos perante o posto de controlo local do Veterinary Cordon Fence, a Linha Vermelha Namibiana, criada para controle da febre aftosa e outras doenças do gado.
Dois funcionários abordam-nos com modos secos. “Podem abrir lá atrás? O que é que levam no frigorífico? Alguma carne ou assim?” “Abrimos, claro que sim, mas só vão encontrar duas malas quase soterradas na poeira. Frigorífico teria sido óptimo. Não nos calhou nenhum!” Ao abrirmos a porta traseira da pick up, os agentes empoeiram-se.
Desmotivam-se de investigarem o que levávamos nas malas. Dão-nos uma folha de registo para assinarmos. Dizem-nos para seguirmos, sem nos desejarem boa viagem.
O Palmwag Lodge que nos ia acolher já só distava 6km. Estava a cinco ou seis minutos finais. Demoramos mais a lidarmos com as vendedoras himba e herero que nos cercam. Outro tanto a atestamos a pick up.
Pela enésima vez desde Windhoek.
Instantes depois, voltamos a deter-nos. A uns poucos metros da beira da estrada, duas girafas mordiscam árvores moringas, brotadas como milagres ressequidos do solo pedregoso.
Palmwag Lodge e o Oásis do rio Uniab
Damos com o lodge, quase sobre o rio, integrado no palmeiral e na mancha vegetal densa na sua base, contrastante com as elevações ocre e gráficas em fundo, montes afiados e mesetas.
Por ali, mesmo em época seca, o Uniab preservava uns poucos charcos e lençóis freáticos generosos. Sem surpresa, a água sustém a vida vegetal exuberante. Ambas, atraem uma fauna sedenta.
O quarto em que nos instalamos fica logo acima do ervado que preenche o leito. Ora, entre os extras faunísticos que tornaram o Palmwag Lodge famoso e concorrido, contam-se as visitas frequentes de manadas de elefantes.
O Uniab, as terras baixas nas suas margens e o planalto de Etendeka são habitat de zebras de montanha, vários tipos de antílopes, girafas-angolanas, entre outros.
Em função destes herbívoros, também de leopardos, chitas, hienas-malhadas e até de leões, para mencionarmos apenas as espécies mais familiares.
Sobre as quatro e meia da tarde, saímos para explorar o rio e o seu entorno. Ainda perguntamos, na recepção, se há um trilho que nos permita subir às elevações destacadas para lá da margem oposta.
“Haver há. Mas a ideia de virem cá nunca foi servirem de refeição de leopardos ou hienas!
Por isso, vão manter-se do lado de cá do rio e nem sequer desçam para junto do matagal. Nunca se sabe o que se pode por lá esconder.”
Rendemo-nos, de uma vez por todas, às evidências. Afastamo-nos.
Descemos apenas o suficiente para fotografarmos uns poucos embondeiros recém-nascidos, com formas de árvores-garrafa deslumbrantes.
Ocaso Resplandecente e um Despertar Madrugador
Com o pôr-do-sol, intensificava-se o risco de por ali cirandarmos. Refugiamo-nos para próximo do jardim e das piscinas do lodge.
Dali, o palmeiral-de-leque ficava entre nós e o ocaso.
Gera silhuetas que nos entretemos a enquadrar e a combinar.
Parte da fauna diversa que descrevemos, Palmwag tornou-se especial como ponto de partida para avistamento de uma das criaturas raras e em perigo de extinção da Namíbia e do Mundo.
Palmwag e os Rinocerontes Negros em Perigo de Extinção
Falamos do rinoceronte negro do sudoeste africano, uma subespécie de que, até há pouco, Angola conservava de um a quatro espécimes. Bem mais abundantes na Namíbia. Foi também recentemente introduzida na África do Sul, parte de um esforço internacional de preservação.
Estão, em qualquer dos países, sob ameaça de caçadores furtivos pagos para lhes removerem os chifres, há muito considerados terapêuticos ou milagrosos pela medicina tradicional chinesa e, apesar da evolução social e tecnológica da China, ainda com enorme procura.
Estima-se que 70% destes rinocerontes que subsistem em vida selvagem estejam na concessão de Palmwag. São – bem mais que os prolíficos elefantes – o principal atractivo da zona.
Ora, na madrugada seguinte, ainda antes da aurora, íamos sair em sua busca.
Viagem de Palmwag à Torra Conservancy
Partimos rumo a sul, pela mesma C43 que nos tinha levado de Twyfelfontein a Palmwag. À entrada do Inverno do hemisfério sul, faz um frio que o vento gerado pela velocidade do jipe aberto agrava.
Apanhados desprevenidos, embrulhamo-nos o melhor que conseguimos, num poncho felpudo que o guia tinha passado aos participantes.
Sofremos mais de uma hora de briol no breu.
Às tantas, o condutor deixa a estrada principal para uma via mal definida que nos leva para terras mais altas da Torra Conservancy, um de vários domínio namibianos incumbidos de preservar a vida animal.
O sol começa a nascer.
Aos poucos, alaranja um domínio marciano que banalizava alguns dos esdrúxulos que havíamos testemunhado na Namíbia:
ondulante, coberto de rochas oxidadas, salpicado de arbustos eufórbia verdes, em cuja seiva venenosa os bosquímanos embebem as pontas das suas flechas.
Acima, outras girafas alimentam-se das suas moringas predilectas.
Deixamos o jipe.
Munidos de binóculos, três guias perscrutam a paisagem.
Ovni, o Pisteiro San entra em Acção
Um deles é Ovni, um jovem bosquímano, como é apanágio dos bosquímanos, perito a seguir rastos e encontrar animais.
Ovni deixa os restantes guias. Inaugura o seu trabalho investigativo, de olhos bem focados no chão.
Ainda o vemos desaparecer para trás da vertente em que pastavam as girafas.
O duo de namibianos que ficara, faz-nos formar uma fila indiana. Um deles, segue adiante, outro, na cauda.
Caminhamos, a subir, na direcção da montanha mais alta em redor e de uma manada de cabras-de-leque, alinhada lateralmente em vez de, ao comprido, como nós.
Paramos por ali. Sobre o empedrado cor-de-tijolo irregular, entre várias eufórbias que evitávamos tocar.
Os guias voltam a recorrer aos binóculos.
Do Nada, um Rinoceronte Solitário e Desconfiado
Percebemos, por fim, na direcção que observavam, que um grande rinoceronte descia por um vértice entre encostas, e espantava as cabras-de-leque no seu caminho.
Ovni segue-o, a boa distância, até que o rinoceronte se detém e nos sonda, de focinho no ar, a tentar cheirar se constituíamos ameaça.
Acocoramo-nos todos. Com a sua missão cumprida, Ovni refastela-se numa pequena laje diagonal que quase lhe oferece um sofá.
O rinoceronte mantem a sua posição. Permite-nos observá-lo e fotografá-lo por um bom tempo.
Os guias do Palmwag Lodge ditam a retirada.
E um providencial pequeno-almoço, à sombra de umas poucas árvores em redor de uma nascente e respectivo charco.
Os rinocerontes estão num tortuoso caminho da extinção. Com aquela expedição, tínhamos admirado um deles.
E dado um pequeno contributo para a sua salvação.
COMO IR
Reserve o seu programa de viagem na Namíbia com a Lark Journeys: www.larkjourneys.com Whats App: +264 81 209 47 83
FB e Instagram: Lark.Journeys