É imensa a área de savana susceptível a inundar, a sul da Baía de Maputo.
Cumprimos a entrada no parque pelo pórtico de Futi, quase 80km para sul da capital moçambicana. Findo o devido registo, aborda-nos Baptista, responsável pelos guardas que o monitoram.
“Esperem um pouco que já vem lá o vosso homem!” Ernesto Mulungo, “o homem”, só tinha sido avisado à última hora.
Em vez de se posicionar no posto de controle da caça furtiva que lhe seria designado, ia-se juntar a nós e guiar-nos a incursão ao imenso Parque Nacional de Maputo.
Ernesto aparece. Num uniforme militar verde-ruço, com uma velha espingarda M14 ao ombro. Apresenta-se e ao serviço. Encaixa-se no pouco espaço que sobrava no interior atafulhado da pick up.
Valente, o motorista, põe-nos a caminho. Num ápice, confirma-se o porquê de as malas e dos portáteis, dos discos externos nelas arrumados irem dentro e com acolchoamento especial.
As vias do PN de Maputo não são de asfalto, nem de terra batida. São de muita areia sobre um solo irregular, aqui e ali, sulcado por raízes de árvores.
Como as autoridades do parque advertem, só os melhores veículos com tracção às quatro, guiados por condutores experientes e que baixam a pressão dos pneus a rigor, as conseguem vencer.
Valente estava à altura. Não fazia milagres. Em certos trechos, a suspensão dura da pick up multiplicava solavancos bruscos.
Aos poucos, a esforço, habituámo-nos a deles nos abstrairmos. Sabíamos que o parque era especial. Só ainda não tínhamos consciência do quanto.
O Guarda-Parque Ernesto Mulungo e a Re-habilitação Ambiental das Comunidades Locais
Ernesto Mulungo renova as direcções, de acordo com o seu conhecimento irrepreensível do parque, das paisagens e dos lugares que determinadas espécies animais preferiam. Ernesto era nativo de Salanca, uma povoação próxima.
O seu pai já tinha trabalhado para o parque. O à vontade naqueles domínios selvagens de Moçambique, corria-lhe no sangue.
Como acontece, amiúde, com o desenvolvimento de áreas protegidas, muitos dos moradores locais passaram de caçadores furtivos, de colocadores de armadilhas, para funcionários, guardas e guias.
Ou, pelo menos, para respeitadores da vida selvagem. Subsistem excepções, claro está.
Para as combaterem, Ernesto e os colegas mantêm-se alerta, nos seus postos mutáveis.
Em Busca de Elefantes na Planície dos Elefantes
Devido à proximidade do portal de Futi, o primeiro lugar em que nos detemos, é dos que menos necessitam de vigilância. Valente abranda. Ernesto activa os sentidos.
Entramos na Planície dos Elefantes, uma planura que a época das chuvas e a passagem recente das tempestades tropicais “Eleanora” e “Filipo” tinham alagado.
Alvitrava o nome que, por ali, daríamos com paquidermes.
Depressa encontramos uns poucos.
Um jovem macho, com as fontes escorridas de testosterona, embirra de imediato com a presença da pick up e com os humanos.
Ernesto aconselha a Valente uma ligeira retirada. O suficiente para evitarmos a fúria do animal. Em vez da sua carga, apreciamo-lo e aos demais a enfiarem-se, reboliços, numa espécie de floresta juncácea, devido à sua corpulência, com a água apenas pelas patas.
Foram os únicos que por ali detectámos. No seu jeito seco, telegráfico e sincero de comunicar, Ernesto confessa-nos que achava estranho: “mas temos que ver o tamanho deste parque… isto é enorme.
Existem outras lagoas e áreas em que os pastos podem estar mais tenros. Vamos encontrar outros!”
Parque Nacional de Maputo e a sua Entusiasmante Diversidade de Espécies
Ao longo da Planície dos Elefantes, a pouca distância da estrada, avistamos inialas juvenis e adultas, pivas, dezenas de patos a nadarem entre nenúfares.
Garças, girafas que nos parecem ignorar, e macacos-azuis que, ao invés, nos estudam de alto a baixo, detrás de uma ramagem densa.
A fauna do parque continua a revelar-se.
Uns poucos hipopótamos deixam um prado viçoso para a protecção da planície tornada lagoa.
Vemo-los deslizarem em canais delimitados por um qualquer tipo de papiro.
Avançamos até à grande lagoa de Xinguti, a mais longa do parque, apenas suplantada em área pela vizinha de Piti.
Também por ali procuramos, em vão, elefantes e hipopótamos.
Em vez, chamam-nos a atenção duas cegonhas-de-bico-amarelo e um chango (cobo-dos-juncais) tímido.
Das Lagoas à Ponta Membene e ao Índico
Apesar de circularmos em modo safari, tínhamos um destino por atingir: o litoral índico da Ponta Membene e o seu Membene Lodge.
Prosseguimos para noroeste.
A determinada altura, com outro corpo de água salobra hiperbólico à nossa direita. No cimo da lagoa de Munde, já com vista da de Zuali, flectimos na direcção do mar.
Enfrentamos pequenos outeiros em que a estrada se revela ainda mais desafiante.
O lodge surge, pouco depois, dissimulado numa floresta costeira que cobre uma longa barreira dunal.
Voltamos a registar a entrada. Instalamo-nos num dos chalets alinhados na sombra da vegetação.
Logo, percorremos o passadiço que os une à área comunal e de refeições, sempre com as vagas do Índico a afagarem o areal.
Uns anos antes, deslumbrámo-nos com uma zona mais acima no mapa deste mesmo litoral grandioso, o de Machangulo e de Inhaca.
Estimulava-nos a dobrar o facto de desbravarmos e nos podermos banhar no seu prolongamento a sul.
Para isso, tínhamos a manhã seguinte.
Essa tarde, dedicamo-la a procurar outras espécimes e espécies entre as lagoas que salpicavam aquela zona do parque.
Pouco ou nada acrescentou ao safari inaugural, muito menos outros elefantes.
Após um ocaso a que uma nebulosidade densa filtrou a exuberância, regressamos ao lodge. Jantamos à beira-mar. Dormimos embalados pelo marulho e por um coaxar estridente.
Em busca a Imensa Planície dos Changos
O dia seguinte raia solarengo. A pedir uma caminhada pela praia, acima e abaixo das dunas.
E mergulhos demorados que nos refrescassem, que recompensassem o esforço de tais empreitadas.
Deixamos o Membene lodge sobre o meio-dia.
A hora era das piores para retomarmos o modo safari, mas, entre outros, Ernesto Mulungo mantinha o desafio de nos revelar manadas de elefantes mais numerosas.
O guarda-parque sabia bem onde faltava procurá-los.
Percorremos o caminho de acesso ao lodge no sentido contrário.
Deixada para trás a lagoa de Munde, chegados a um ponto do PN de Maputo marcado como 11. Ernesto dita um desvio para norte.
Durante vinte minutos, serpenteamos entre outeiros coroados por bolsas de vegetação, aqui e ali, sob o olhar desconfiado de “cabritos”, como chamava Ernesto aos mais pequenos antílopes.
Atingimos uma crista.
Ernesto informa-nos que se trata do ponto mais elevado do parque e, como depressa percebemos, concedia uma vista desafogada, a toda a volta.
Focamo-nos na imensidão mais baixa a ocidente, uma savana semi-alagada e ervada que víamos salpicada de manadas, sobretudo de zebras e de gnus.
Muitos Mais Elefantes. Manadas de Zebras e Outras
Mas não só.
“Estão ali!” brada Ernesto, do nada, do fundo dos pulmões e da alma, aliviado pelo súbito cumprir da sua missão. De facto, lá estavam.
No sopé da mesma colina, dezenas de elefantes agrupados e com crias, em manadas mais escuras e numerosas que as listadas pelas zebras.
Como suspeitava Ernesto, os paquidermes tinham trocado a “sua” planície pela dos Changos, onde a água, a erva suculenta e o espaço se revelavam infindáveis.
Daquele cimo, víamos uns poucos. Uma mera amostra.
A Degradação Histórica de uma Terra Moçambicana de Elefantes
Em tempos idos, a zona em redor da Baía de Maputo acolhia milhares de elefantes.
Chegada a era colonial, nativos e os portugueses habituaram-se a lucrar com o seu marfim que exportavam para a Europa por valores astronómicos, diz-se que a partir da Ilha dos Portugueses, a norte de Inhaca, ainda mais do PN Maputo.
Em 1932, foi criada a primeira reserva de caça. E, em 1960, uma reserva protectora que teve como propósito recuperar os elefantes da chacina anterior.
Ainda mais, porque, a determinada altura, as autoridades apuraram que integravam uma subespécie distinta, por ser costeira, habituada a viver entre os tandos, as lagoas e o oceano.
Em 1977, deflagrou a Guerra Civil Moçambicana. A chacina regressou, disseminou-se por tantos outros parques, por exemplo pelo Parque Nacional Gorongosa, hoje, regressado à sua anterior riqueza e exuberância.
Mais para o fim do conflito, contavam-se já menos de cem elefantes.
E a Recuperação Pronunciada do Parque Nacional de Maputo
Com Moçambique em paz, as autoridades puderam voltar a estabelecer uma vasta área protegida. Aos poucos, o número de paquidermes aumentou.
Estima-se que, no final de 2023, eram para cima de quinhentos.
Em tal número, sem vedações intransponíveis, os elefantes começaram a aproximar-se de povoações próximas e a destruir plantações.
As autoridades viram-se obrigadas a transferir quase cinquenta para outros parques e reservas de Moçambique.
Ao ritmo a que os elefantes se têm reproduzido no “conforto” do PN de Maputo, poderão ser necessárias soluções complementares.
Com prejuízo para outros parques moçambicanos que poderiam receber mais espécimes, prováveis medidas de contracepção.
COMO IR
Voe de Lisboa para Maputo, com a TAP – flytap.com por a partir de 800€ ida-e-volta. Reserve o seu programa de Moçambique com a Quadrante Viagens: quadranteviagens.pt
ONDE FICAR
Ponta Membene Lodge: https://www.membene.co.mz/
e-mail: [email protected]
Whatsapp: +258 87 016 2730