Mesmo nos meses mais secos, o norte montanhoso da Costa Rica que explorávamos, em redor dos vulcões Miravalles e Tenório é pluvioso.
Mantém as montanhas, encostas e vales da cordilheira de Guanacaste encharcados. Dias antes, tínhamos ascendido até as maiores cascatas do vulcão Miravalles, sob uma chuva inclemente.
Nessa outra manhã, pelas 9h, chegamos a El Pilón com o céu coberto, nublado com tal densidade que atrasaria as primeiras intrusões do sol.
Conscientes de que o lugar era conhecido pelo tom ciano dos seus cursos de água, hesitamos em entrar de imediato.
Preferíamos evitar a frustração de caminharmos a longa distância do trilho, apenas para constatarmos que faltava ao rio a cor que o tornava famoso.

Placas de negócios junto ao PN Volcan Tenório
Ocorre-nos falar com uma das guardas na entrada.
Perguntamos à Dona Cecília se toda aquela chuva não turvaria o rio de terra e de detritos.
“Amigos, o efeito é causado sobretudo pelos minerais que a água leva.” responde-nos, sem esclarecer se as bátegas frequentes na região estragavam o efeito. “Entrem, vão lá e vejam!” acrescenta, pouco sensível à suposta complexidade da questão. Cecília percebe que continuamos inquietos.
A Validação Cromática do rio Celeste e sua Cascata
Aborda um colega, por ali a postos, munido de uma espingarda para o que desse e viesse.
“Esse guarda prova-se mais pragmático. “Vou ligar a um amigo que anda por lá. Já vemos o que nos diz.” Esperamos o término da chamada. “Está bom! Está o azul do costume! Podem ir!” O céu mantinha-se cinzento. Ainda algo desconfiados, fomos.
O trilho depressa nos afasta da estrada que liga Bijagua de Upala a Guatuso.
Leva-nos para o cerne da selva que envolve o vulcão Tenório (1916m), um de vários disseminados por estas terras ticas, em que quase todos os cumes da cordilheira de Guanacaste, mais que cumes, são crateras de vulcões.

Cumes do vulcão Tenório, cordilheira de Guanacaste, Costa Rica
O Tenório, o terceiro mais elevado.
Habituados a puxar pelas pernas, quando damos por ela, já estamos no miradouro dos cones 1 e 2 do vulcão, que possui um total de quatro. Quando lá chegamos, devido às nuvens baixas, não vemos nenhum deles.
Pior, estranhamos o facto de ali estarmos, sem termos passado pelo desvio para a grande queda d’água do parque. Aparecem duas caminhantes francesas. Aproveitamos para esclarecer o mistério. “então, mas isso ficou lá para trás. É logo depois do início do trilho.”
Espantamo-nos com a falha. Sem alternativa, revertemos.
Por essa altura, os raios solares começavam a cruzar o manto de nuvens. Ao chegarmos ao topo do caminho certo, escutamos um marulhar longínquo.
Quase de volta ao Início e a Visão Recompensadora da Queda d’água
Umas centenas de metros para abaixo depois, o trilho dá lugar a uma escadaria sinuosa, de degraus altos. Invade um anfiteatro natural, forrado de vegetação ainda mais verdejante e exuberante que a da selva em volta.

Tronco de feto no PN Volcan Tenório
Num dos meandros da escadaria, entre árvores colossais, desvendamos, por fim, o leito do rio Celeste.
Cai 30 metros. De uma falésia coberta de mais árvores, arbustos e líquenes, para uma lagoa cavada na rocha.
Descidos outros tantos degraus, refresca-nos o borrifar vigoroso da queda d’água, responsável pela irrigação permanente do anfiteatro.

Queda de água e lagoa do rio Celeste
Devido ao salpicar das objectivas, a muito custo, fotografamos aquele cenário irrepreensível.
Tal como contávamos e ilustra o nome do rio, assim que assenta na lagoa e perde a súbita oxigenação, a água assumia o azul-turquesa característico do Celeste no percurso entre a sua génese ali próxima e a foz no lago Cocibolga, no sul da Nicarágua.
Um Azul mais Aquático e Químico que Gerado pelos Raios Solares
Quase a pique, o sol começava a incidir no vale exíguo. Em vez de, como estimávamos, acentuar o tom sideral do rio, branqueava-o, tornava-o menos azul. Decididos a registar o Celeste em todo o seu esplendor, esperamos que as nuvens filtrassem os raios solares.
Aquele azul fluvial tinha uma origem bem diferente do de tantos litorais marinhos por esse mundo fora. Gerava-o o enxofre libertado pelo vulcão Tenório que exacerbava a precipitação do carbonato de cálcio e silicato de alumínio abundantes nas rochas do leito e no caudal.
Mesmo do quase fundo da escadaria, a vegetação densa ocultava a continuação do rio. Como viríamos a confirmar, o Celeste prosseguia para norte, ainda sideral, com visuais distintos da queda d’água e lagoa que, entretanto, nos decidimos deixar.
O regresso ao cimo da escadaria e ao trilho principal exige-nos um trabalho de coxas que as sobreaquece.
Cumprido o castigo, caminhamos, ora em planura, ora a descer, lado a lado com o rio e para seu montante.

Cumes do vulcão Tenório, cordilheira de Guanacaste, Costa Rica
Cruzamo-lo por mais que uma vez, por pontes suspensas subtis, cobertas de líquenes e musgo que quase passam por naturais.
Árvores seculares despontam das margens, várias, tomadas por figueiras-da-Índia que as estrangulam com os seus ramos e lianas tentaculares.
Variações e Derivações do Prodigioso Rio Celeste
À boa maneira da Costa Rica, as autoridades preservam o visual orgânico do parque e das suas paisagens.
As placas com direcções e avisos são só umas poucas, essenciais, feitas de madeira escura com as letras amarelas: “Laguna Azul; Borbollones; Teñideros”.

Borbullones, rio Celeste, PN Volcan Celeste
As chuvadas frequentes e a humidade elevada tinham já apodrecido os suportes de uma delas.
Em vez de os substituírem, os rangers encostaram-na a uma árvore repleta de lianas finas.
Louvamos o resultado como se uma qualquer instalação artística se tratasse, já com mais de vegetal do que de humano.

Placas presa a uma árvore do PN Volcan Tenório
Atingimos os borbollones.
Nessa secção diminuta de um riacho afluente, o Robles, uma fractura em profundidade liberta água a 60º e gases carregados de enxofre que dão ao leito um PH de 2.4, cheiro a ovos podres e, claro está, bolhas emergentes.
Não tarda, atingimos Los Teñideros (leia-se tingidores) um ponto ainda mais próximo da génese do Celeste.
Ali, unem-se dois caudais prévios, o do rio Buena Vista e o do Quebrada Agria, ambos transparentes, o último, assim denominado devido à alta acidez da sua água.
Deste encontro, resulta uma combinação química inesperada e o azulado do rio Celeste predominante a jusante.

Rio Celeste, Parque Nacional Volcan Tenório, Costa Rica
Um Parque Já Adulto, só Recentemente Explorado
Com o avançar do dia, o número e a diversidade nacional de visitantes do parque aumentava a olhos vistos. O Parque Nacional Vulcão Tenório foi criado em 1976.
De então até 2018, por ausência de vias, esta área agora acessível a partir da estação de El Pilón não teve visitantes, além de uns poucos cientistas e funcionários do SINAC (Sistema Nacional de Áreas de Conservación) da Costa Rica.
Sobretudo durante 2019, o número de visitantes aumentou de forma abrupta. O fenómeno prosseguiu em parte de 2020, malgrado a Pandemia, quando as autoridades costarriquenhas permitiram aos ticos e forasteiros caminharem nos seus parques, se bem que com máscaras.
De 2019 em diante, em plena era de vícios instagrâmicos e influencers a exuberância azul-celeste e tropical do PN Vulcão Tenório granjeou-lhe enorme notoriedade. Ao ponto de as autoridades se terem visto forçadas a impor uma quota diária de entradas.
Contornámos essa cota. No fim da manhã, percebemos que o trilho principal começava a ficar sobrelotado.
Inviabilizava os avistamentos que ansiávamos da fauna peculiar da zona.

Oropendula, uma das aves mais comuns na zona do PN Volcan Tenório
Fauna e Flora Exuberantes mas Grandes Animais Difíceis de Avistar
Dos seus vários tipos de macacos, das cobras, preguiças e tapires, das aves vistosas como os tucanos, as oropendolas e os pica-paus. Muito mais difíceis de avistar, até de felinos como os ocelotes, os pumas e jaguares.
Ainda detectamos uma qualquer víbora que cruzava um trilho, uns poucos guaxinins que os ticos tratam por mapaches, farejadores, mas fugidios.
Examinamos caravanas deslumbrantes de formigas-cortadeiras.
Pouco mais.

Pequeno lagarto do PN Volcan Tenório, Costa Rica
Era suposto termos caminhado 6km de ida-e-volta.
Contados os equívocos e reversões desnecessárias, percorremos quase 9km. Em cinco horas em vez das menos que quatro que a maior parte dos visitantes leva.
Sentíamo-nos exauridos, mas recompensados. E estimulados para o vulcão e Parque Nacional da Costa Rica que se seguisse.
Ditou o destino, que fosse o Rincón de La Vieja.
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