Panorâmica de Saint-Pierre ao anoitecer.
Panorâmica de Saint-Pierre ao anoitecer.
Fiéis durante uma missa mariana na catedral da cidade.
Crentes deixam a Catedral de Saint Pierre.
Grupo de crentes descem do miradouro elevado a que subiram para visitar a estátua da notre dame de Bon Port.
A montanha vulcão Pelée que, em 1900, arrasou Saint-Pierre.
Visitantes da montanha Pelée observam a encosta do vulcão.
Condutora de um autocarro que trouxe dezenas de fiéis a um encontro mariano em Saint Pierre.
Veleiros ancorados ao largo do centro de Saint-Pierre.
Crentes deixam a igreja no fim de uma homília, parte do encontro mariano a ter lugar na catedral de Saint Pierre.
Crente reunidas em branco durante uma missa na catedral de Saint Pierre.
Casario de Saint Pierre, com a catedral homónima enferrujada em destaque.
Duas fiéis almoçam numa pausa de um encontro mariano em Saint-Pierre.
Velho relógio da biblioteca de Saint Pierre.
Betty Moustin, uma crente mariana desce de um miradouro sobre Saint Pierre, abençoado com a estátua da virgem.
Estátua da Notre Dame de Bon Port abençoa Saint Pierre e os seus pescadores e navegadores.
Panorâmica de Saint-Pierre ao anoitecer.
Em 1900, a capital económica das Antilhas era invejada pela sua sofisticação parisiense, até que o vulcão Pelée a carbonizou e soterrou. Passado mais de um século, Saint-Pierre ainda se regenera.
Marco C. Pereira
(texto)
e
Marco C. Pereira-Sara Wong
(fotos)
Um percurso fotogénico, repleto de curvas, contracurvas e paragens espontâneas para contemplação dos cenários tropicais luxuriantes tinha-nos retido demasiadas vezes e atrasado sem remédio. O dia já se esgotava quando chegamos finalmente ao início do trilho que conduzia à cratera do vulcão, então escondida por detrás de um manto de nuvens brancas e baixas.
Uns poucos caminhantes regressavam extenuados daquelas alturas veladas e entregavam-se a repastos salvadores no bar instalado junto ao parque de estacionamento. Outros, em óbvio improviso, tentavam perceber se ainda estavam a tempo de subir. Seguimos um casal que recorre a binóculos para desvendar de que eram feitas aquelas alturas. Como eles, decidimos adiar a expedição. Conhecíamos a fama aterrorizante das víboras fer-de-lance da Martinica. Ainda assim, ficamos a explorar a encosta húmida em que a erva alta e restante mato tinham subsumido qualquer sinal de lava. Pouco depois, regressamos à estrada serpentina, contornamos o sopé amplo da montanha e apontamos a Fort-de-France.
A manhã trás o sol escaldante de volta sobre a capital mas também o desejado fim-de-semana. Uma banda de rua ocupa um recanto sombrio junto a um centro comercial incaracterístico e anima a praça com as suas vozes em coro, uma bateria sincronizada de jambés e outros instrumentos de percussão. Descobrimos que são os San Chènn. Nunca os interpelamos mas, pelo nome, depreendemos que têm como móbil a celebração da cultura nativa da ilha e, mais que isso, da libertação dos escravos da longa sujeição aos colonos franceses que, duas semanas depois, ali teria a sua efeméride.
Louis-August Cyparis, nascera, em 1875, quase três décadas depois de o governador Victor Schoelcher ter assinado a abolição da escravatura no território. Gozava, portanto, de uma autonomia existencial até há alguns anos impensável. Mas num de tantos dias de álcool excessivo em Saint-Pierre, envolveu-se num conflito com um conterrâneo que feriu com uma faca. Foi condenado a um mês de prisão. Próximo do termo da pena, escapou-se. De novo capturado, viu a pena aumentada em oito dias. Ironia das ironias, este agravamento do castigo, haveria de o salvar de um fim trágico e de o promover ao estatuto de herói excêntrico e atarantado da comunidade afro predominante na província francesa ultramarina.
Explicava-se, assim, porque os San Chènn repetiam o seu nome vezes sem conta, como parte do refrão de uma canção que o retrata e imortaliza. Continuava, no entanto, a faltar-nos a descoberta da povoação em que vivera e o episódio mais escaldante da sua existência de cobaia do destino.
Avançamos para norte, quase sempre com a costa oeste do Mar das Caraíbas à vista e por um litoral encurtado por encostas abruptas. Saint-Pierre não tarda.
O bafo tropical aperta mais que nunca quando chegamos à entrada da cidade. Pouco incomodados, ignoramos a brisa litoral e metemo-nos por uma ladeira que uma placa perdida na vegetação confirmava conduzir-nos a um semi-promontório.
Só chegamos a meio-caminho quando temos que interromper a marcha esforçada do carro. Um pelotão de senhoras faladoras em trajes alvos de eucaristia desce e bloqueia a estrada. Betty Moustin, pergunta-nos se vamos ao miradouro: “Nós vimos agora de lá. É um lugar especial”, assegura-nos, sorridente, como se inspirada por uma visão.
Estávamos em Maio. Percebemos que faziam parte de uma peregrinação Mariana à cidade e que regressavam de rezar naquele cimo. Completamos a ascensão. Um derradeiro trilho ervado e descendente conduz-nos à plataforma. Dali, a montanha Pelée mais distante e a baía preenchida pelo mar das Caraíbas delimitavam um cenário inolvidável. Pelo meio, afirmava-se, rejuvenescido, o casario avermelhado e branco de Saint-Pierre, entre o areal cinzento que a povoação tomou de assalto e a arriba frondosa oposta.
O fascínio provou-se instantâneo mas prolongado. Concordamos que uma pintura como aquelas tinha que ser apreciada sob luz condigna. Prometemos regressar em boa hora e descemos de volta ao âmago da cidade.
Centenas de devotos circulam em redor da catedral e entre o templo e uma casa comunal que lhes serve refeições e um convívio religioso. Pouco depois, tem início uma missa. A igreja enche-se de fiéis de todas as partes da Martinica que combatem o calor com lenços, leques e outros abanicos de recurso.
Apesar do vestido verde-garrido afro e do turbante amarelo-torrado que a coroa e destaca da multidão, Fedia, também tem a sua função no evento: “porque é que estou tão colorida? Pois... pode não parecer mas sou motorista e gosto de alegrar os meus passageiros. Trouxe um autocarro cheio de crentes de Sainte Marie até cá. Agora estou à espera para os levar de volta”.
Só recuando mais de 100 anos poderíamos encontrar uma Saint-Pierre tão exuberante e ocupada. Quando visitamos as ruínas da cela que reteve Cyparis, confrontamo-nos com a calamidade sofrida pela antiga capital da Martinica e com a sorte reservada para o prisioneiro.
No virar do século XX, a montanha Pelée era considerada um vulcão adormecido mesmo se, desde 1889 e, em especial em Abril de 1902, se verificava alguma actividade de fumarolas sulfídricas na cratera.
A partir do fim do mês, a montanha impôs vários caprichos geológicos. Projectou pequenas amostras de cinzas, depois rochas, produziu tremores de terra, fez o mar recuar 100 metros, para logo retornar à linha de água normal, entre várias outras manifestações. Finalmente, na manhã de 8 de Maio, dia da Ascensão, os habitantes observaram incandescências no cume do vulcão.
O operador de telégrafo transmitiu, no entanto, a Fort-de-France um relatório sem qualquer desenvolvimento que terminou com “Allez”, com o que, às 7h52, passou a palavra ao interlocutor. No momento seguinte, a linha foi cortada.
Os tripulantes de um barco de reparação do telégrafo testemunharam o que se passou. Uma nuvem ardente negra densa espalhou-se na horizontal, a partir do sopé do vulcão. Uma segunda, monstruosa, em forma de cogumelo e composta de poeiras, vapores, cinzas e gases vulcânicos foi visível a 100km de distância. Mais tarde, calculou-se que a velocidade inicial de ambas teria sido de quase 670 km/hora. A temperatura, no interior, ascendeu aos 1000º.
Saint-Pierre sucumbiu àquele inferno regurgitado das profundezas da Terra. Das pessoas que estavam na cidade, 28.000, a quase totalidade dos habitantes, pereceu.
Mas, como narra o tema popular entoado pelos San Chènn, Louis-August Cyparis não foi uma delas. Protegido pelos muros amplos da cela sem janelas que o retinha, o prisioneiro foi socorrido passados três dias, por um homem de Morne-Rouge que ouviu os seus gritos. Sofrera queimaduras dolorosas no corpo mas resistia.
O evento depressa correu o mundo. Assim se propagou também a fama do felizardo Cyparis que, pouco depois, seria recrutado pelo circo norte-americano Barnum, para se exibir e às suas queimaduras, em digressão internacional, como o único sobrevivente milagroso da catástrofe.
À época, Saint-Pierre era a capital económica da Martinica e das Antilhas. O comércio do açúcar atraía barcos de todo o mundo à sua enseada e os proveitos daí decorrentes financiaram uma das primeiras redes de iluminação urbana eléctrica das Américas, um trólei puxado por cavalos, um teatro com 800 lugares, um jardim botânico e um porto híper-activo. Nuns poucos minutos, a montanha elegante que há muito convivia com a cidade reduziu-a a escombros e a carvão.
Tal como planeado, quando a tarde começa a encerrar-se voltamos a subir ao miradouro e a submeter-nos à supervisão altiva da estátua da Notre Dame du Bon Port, também ela derrubada e afastada do seu lugar original pela erupção e mais tarde colocada naquele pedestal elevado como que para preservar a cidade de nova hecatombe.
Alguns anos depois da destruição, os habitantes que estavam ausentes e outros forasteiros uniram esforços para recuperar os primeiros edifícios. Com o passar do tempo, a estrutura urbana foi efectivamente restaurada até ao aspecto embelezado que dali contemplamos.
Vemos o sol pôr-se, apressado, sobre o mar. O lusco-fusco instala-se e a iluminação urbana ganha vigor, reforçada pelos rastos de luz deixados pelos veículos que se cruzam na grelha geométrica.
Moradores e visitantes celebram o fim de mais um dia caribenho acolhedor nas esplanadas da rua marginal e a bordo de alguns veleiros ao largo. Aos poucos, Saint-Pierre é tomada pelo ocre de um fogo ténue que se reflecte na baía contígua e contrasta com o negrume soberbo da montanha Pelée. A imagem remete para a tragédia que quase a apagou do século XX mas, mesmo sem o fulgor de outros tempos, a Paris das Caraíbas dá sinais de vida.
A Terra não pára.
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Como ir:
VISTOS E PROCEDIMENTOS
Se tem cidadania portuguesa só necessita de Cartão de Cidadão válido para entrar em Martinica. Cidadãos brasileiros e da restante CPLP precisam de requerer visto. Os vistos Schengen não são válidos, os detentores devem requerer um visto específico. Mais informações em Martinique Visa
CUIDADOS DE SAÚDE
As autoridades francesas não requerem qualquer vacina em particular para permitir aos visitantes entrada em Martinica. Não existe risco de malária na ilha, nem outros riscos para a saúde dignos de registo. Mais informações em FitForTravel
VIAGEM PARA MARTINICA
À data de criação deste texto, a Air France tel.: 707202800, voa de Lisboa para Fort-de-France nove vezes por semana via Paris, nuns dias com escala no aeroporto de Orly, noutros no de Charles de Gaulle. O voo custa cerca de 1100€, em económica, cerca de 1800€ em classe Premium.
Explorar o destino:
ALUGUER DE CARRO
O ideal é alugar um veículo, 4WD se desejar explorar os trechos mais alternativos da Martinica. A rede de estradas asfaltadas da ilha é boa e muito abrangente. Os preços dos veículos alugados começam em volta dos 30€ por dia para alugueres de alguma duração, por exemplo uma semana.
AUTOCARROS
Apesar de existirem autocarros públicos de maiores dimensões, a grande parte dos transportes com que se irá cruzar são os taxis collectivs que, além de identificados com TC, têm mencionados os destinos sobre o para-brisas. Detêm-se em paragens assinaladas. Os taxis collectifs cobram bastante menos, menos de 4€ por uma viagem de 45 minutos.
TAXIS
Recorra aos taxis apenas se estiver preparado para preços francófonos (leia-se elevados), pagos em euros.
Meteorologia / Quando Ir:
Esta ilha das Antilhas tem um clima tropical durante todo o ano. A altura mais agradável para visitar (mas também a mais turística) é a época seca, de Dezembro a Maio, quando chove menos e as temperaturas máximas médias rondam os 26º. A época das chuvas começa em Junho e estende-se até ao fim de Novembro com aguaceiros forte praticamente diários e um ar bastante mais húmido. Agosto e Setembro são os meses mais húmidos e chuvosos e também propícios à visita de ciclones.
Dinheiro & Custos:
A moeda usada nas Antilhas Francesas (Martinica e Guadalupe) é o Euro. A maior parte dos estabelecimentos, até mesmo muitos dos menos sofisticados permitem pagamentos com cartões de crédito e débito. As caixas ATM são abundantes nas principais povoações. À imagem da maior parte dos territórios ultramarinos franceses, a Martinica depressa se revela um destino dispendioso.
ALOJAMENTO
As diárias começam em redor dos 85€ por quarto duplo nos hotéis mais humildes. Vai ter dificuldade em encontrar algo mais barato que isto.
ALIMENTAÇÃO
É a população da Martinica a primeira a queixar-se dos preços demasiado elevados da alimentação na sua ilha, mesmo se as compras forem feitas nos supermercados. Se se pensar que os restaurantes acrescentam valor inflacionado ao que ali compram servem, ficam justificados os pratos entre os 13 e os 15€ e o custo das refeições em restaurantes normais, entre os 30 e os 50€, para começar.
INTERNET
Vai-se encontrando com maior frequência, oferecida por hotéis, bares e restaurantes. De outra forma, custa em redor de 5€ à hora em internet cafés.
A não perder:
Martinica:
Fort-de-France - Biblioteca Schoelcher e Catedral St Louis
Saint Pierre - Catedral Saint Pierre et Saint Paul, vista do Miradouro da Notre-Dame-du-Bon Port
Vulcão Mont Pelée
Sainte Anne
Grande Anse
Sainte Luce
Grande Riviére
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Trois-Ilets
Anse Cafard - Monumento dos escravos
Destilaria Saint James e Museu do Rum
Guadalupe:
PN de Guadalupe em Basse Terre
Route de La Traversé em Basse Terre
Miradouro La Soufriére em Basse terre
Queda d'água Cascade aux Ecrevisses
Mercado de Basse-terre
Catedral São Pedro e São Paulo
Praias de Grande Anse
Deshaies
Marie-Galante
Como ir:
VISTOS E OUTROS PROCEDIMENTOS
Cidadãos da União Europeia necessitam apenas de um cartão de cidadão válido mas podem igualmente usar passaporte válido para entrar no território. Deverá também apresentar um bilhete para regresso ao destino de partida ou de saída para um outro destino.
CUIDADOS DE SAÚDE
Para mais informações sobre saúde em viagem, consulte o Portal da Saúde do Ministério da Saúde e Clínica de Medicina Tropical e do Viajante. Em FitForTravel encontra conselhos de saúde e prevenção de doenças específicas de cada país (em língua inglesa).
VIAGEM PARA A MARTINICA
A Air France (tel.: 707 202 800) voa de Lisboa para Fort-de-France via Paris, nuns dias com escala no aeroporto de Orly, noutros no de Charles de Gaulle. O voo custa a partir de 1.100€, em económica, 1.700€ em Premium, que oferece uma melhor localização no avião e conforto adicional. Em executiva (poltrona de 2 m por 61 cm), fica por cerca de 3.200€.
Explorar o destino:
ALUGUER DE VIATURA
Num destino como a Martinica, o ideal é ter ao dispor um veículo de preferência 4WD ainda que não seja imperioso. A rede de estradas da ilha é muito abrangente e foi construída ao jeito semi-perfeccionista francês. Os preços dos veículos alugados começam em volta dos 30€ por dia para alugueres de alguma duração, por exemplo uma semana.
AUTOCARRO
Apesar de existirem autocarros públicos de maiores dimensões, a grande parte dos transportes com que se irá cruzar são os taxis collectivs que, além de identificados com TC, têm mencionados os destinos sobre o para-brisas. Detêm-se em paragens assinaladas. Os taxis collectifs cobram bastante menos, menos de 4€ pela viagem de 45 minutos entre Fort-de-France e Saint Pierre.
OUTROS
Recorra aos táxis apenas se estiver preparado para preços do género dos franceses ou ainda mais elevados, pagos em euros.
Meteorologia / Quando Ir:
Martinica tem um clima tropical com época seca - e consequentemente alta em termos turísticos - de Dezembro a Maio. Neste período, as temperaturas médias mantêm-se por volta dos 25ºC aos 30ºC durante o dia. A época das chuvas estende-se de Junho quase ao fim de Novembro mas, por norma, traz chuvadas fortes por volta do fim do dia. Setembro e Agosto são os meses mais chuvosos e também aqueles em que a ilha tem maior probabilidade de ser atingida pelos furacões que se formam sobre o oceano Atlântico, em particular sobre o Mar das Caraíbas.
Dinheiro & Custos:
À imagem da maior parte dos territórios ultramarinos franceses, a Martinica depressa se revela um destino dispendioso, até porque usa o Euro (EUR). A maior parte dos estabelecimentos, até mesmo muitos dos menos sofisticados permitem pagamentos com cartões de crédito e débito. As caixas ATM são abundantes nas principais povoações.
ALOJAMENTO
Preços começam em redor dos 85€ por quarto duplo nos hotéis mais humildes. Vai ter dificuldade em encontrar algo mais barato que isto.
ALIMENTAÇÃO
É a própria população da Martinica a primeira a queixar-se dos preços demasiado elevados dos alimentos na sua ilha, mesmo se comprados nos supermercados. Se se pensar que os restaurantes acrescentam valor inflacionado ao que servem, ficam justificados os pratos entre os 13€ e os 15€ e o custo das refeições em restaurantes normais, entre os 30€ e os 50€, para começar.
INTERNET
Vai-se encontrando com maior frequência, oferecida por hotéis, bares e restaurantes. De outra forma, custa em redor de 5€ à hora em casas de Internet.