Até 2004, a viagem a partir do Seixal ainda era completada na estrada velha, sinuosa e com vista vertiginosa sobre o Atlântico.
Da última vez que a cumprimos, já o Túnel da Fajã da Manuel nos leva, pela fajã epónima, sem qualquer panorama, quase às portas do destino.
Coincidência ou não, o primeiro edifício no exterior, surge ocupado pela PSP, sugere alguma atenção para com a paz e a ordem. Porto Moniz garante muito mais que apenas isso.
Ao avançarmos pela Rua do Forte de São João Baptista para a Frente de Mar local, damos com uma realidade paralela, de evasão, de lazer salgado que se alastrava pelo litoral negro e rugoso da cidade.
O Deslumbrante Domínio Balnear das Piscinas Naturais
Passamos o Aquário da Madeira, apontados às Piscinas Naturais Velhas.
Ali, com o Ilhéu Mole a insinuar-se a norte, uns poucos casais chapinham e nadam, deleitam-se na água apartada do Atlântico por uma frente de fragas vulcânicas, uma água cor-de-esmeralda, em vez da azul-turquesa do oceano sem fim.
A disposição e as formas da lava solidificada prendam os forasteiros banhistas com um reduto inundado de mistério que desvendam em câmara lenta, imbuídos de uma missão de diversão.
Sem que o esperem, aqui e ali, cruzam-se uns com os outros.
Saúdam-se, sorridentes, a partilharem a mesma revigorante talassoterapia, nas Piscinas Velhas, bem mais tranquila e exclusiva que a das modernas e mais vastas a ocidente, dotadas de infra-estruturas e acrescentos artificiais que maculam o conceito “Piscinas Naturais”.
Ainda assim, não obstante serem pagas, recebem muitos mais banhistas que as Piscinas Velhas que continuamos a apreciar.
Um barco ruma ao estreito formado pelo Ilhéu Mole e ao porto virado a sul.
A sua navegação acelerada serve de pretexto de contemplação a um casal seduzido pelo Atlântico.
Aproximam-se da orla de cimento que encerra a lagoa.
Debruçam-se, ao alcance das vagas mais vigorosas. Instalam-se por ali, por bastante tempo, capturados naquela deslumbrante fronteira aquática e cromática.
O Casario Equilibrista de Porto Moniz, Madeira
Como se não bastasse, de alguns desses pontos, os panoramas provam-se duplos.
Na direcção oposta, impõe-se ainda o interior da ilha da Madeira, as vertentes íngremes que, do nível do mar, se elevam acima dos 1000 metros.
E o casario de Porto Moniz, em modo de equilibrismo, na secção inferior da encosta.
Na actualidade, esse casario surge disposto numa imensidão de socalcos agrícolas que servem cada um dos lares.
E, se hoje assim é, já assim seria, pouco depois da chegada dos colonizadores portugueses.
Então, como agora, a ilha era feita da mesma orografia e geografia, com ressalva para a expansão do oceano que provavelmente cobriria maior área da laje vulcânica.
Ao contrário dos nossos dias, em que o turismo se mantém, de longe, o maior sustento, num largo período pioneiro, a agricultura e a silvicultura provaram-se os únicos.
Foram, aliás, a par da expansão do Reino de Portugal, o principal móbil da colonização da Madeira, incluindo o recanto da costa Norte agora conhecido como Porto Moniz.
A Descoberta e Colonização da Madeira e de Porto Moniz
Está por se apurar, com a devida exactidão, o ano em que os colonos portugueses começaram a desbravar estas partes da ilha. Gonçalves Zarco, Tristão Vaz Teixeira e Bartolomeu Perestrelo zarparam de Porto Santo, diz-se que intrigados com um manto estável de nuvens que de lá avistavam.
A 1 de Julho de 1419, um ano depois de terem desembarcado em Porto Santo, ancoraram na actual praia do Machico e assim descobriram a Madeira.
A Coroa Portuguesa atribuiu os destinos das ilhas ao Infante Dom Henrique, líder dos Descobrimentos. Ora, o povoamento da Madeira começou a desenrolar-se seis anos após a chegada do trio de navegadores, em 1425.
Numa ilha com tal orografia, demorou o seu tempo, a partir da Capitania do Machico atribuída a Tristão Vaz Teixeira. E da do Funchal, concedida a João Gonçalves Zarco.
Durante alguns anos, a zona litoral e baixa de Porto Moniz e de Ribeira da Janela era tratada por Janela da Clara. A mais elevada na encosta, situada entre os Lamaceiros e as Achadas da Cruz, por Ponta do Tristão.
O Colono Pioneiro e Epónimo Francisco Moniz
Com a práctica das sesmarias em pleno, Francisco Moniz, um algarvio de ascendência nobre, herdou do seu pai João Lourenço, terras no noroeste da Madeira. Já na ilha, casou-se com Dª Filipa da Câmara, neta do descobridor Gonçalves Zarco.
Estabeleceram o seu lar numa área que Francisco Moniz veio a abençoar com a edificação da Capela de Nª Srª da Conceição, a actual Igreja Matriz.
Até à sua morte, em 1533, ou 1535, Francisco Moniz foi um dos primeiros povoadores do noroeste da Madeira.
A partir da sua fazenda, coordenou a chegada de outros fazendeiros e camponeses, encarregues da produção agrícola, silvícola e de criação de gado que permitiria a colonização do resto da ilha.
Francisco Moniz assegurou também que um porto servisse o seu domínio. Crê-se que o baptizou com o seu apelido.
Com os anos, Porto Moniz popularizou-se e institucionalizou-se.
Pelo menos, em 1577, as Cartas Régias emitidas pelos reis Filipes de Espanha, usavam já esse termo para definir as terras antes pertença de Francisco Moniz.
Quase meio milénio depois, Porto Moniz perdura e prospera.
A Riqueza Turística das Piscinas Naturais de Lava
Atributos que os primeiros colonos pouco ou nada estavam qualificados para apreciar, valorizaram-se com a qualificação e reconhecimento turístico internacional da Madeira, sobretudo as piscinas de mar e lava por que os novos viajantes anseiam.
Não só.
O Porto Moniz é um ponto de partida privilegiado para incursões às alturas da floresta exuberante do Fanal, para caminhadas pelas levadas mais próximas e para a exploração de outras atracções imperdíveis do município, como é o caso das vertiginosas Achadas da Cruz.
De volta ao cerne de Porto Moniz, antes ou depois da exploração das piscinas, é habitual famílias com crianças visitarem o pequeno Aquário da Madeira.
Muito por conta dos seus doze tanques com peixes comuns nos mares da Macaronésia. E, em particular, dos tubarões.
O Aquário da Madeira está instalado numa reconstrução, toda ela de basalto, de um forte secular.
Por volta do século XVIII, a ilha tinha-se desenvolvido sobremaneira e abrigava as suas riquezas. Disso conscientes, piratas que operavam a partir do litoral magrebino de África, mas não só, começaram a alvejar as povoações.
“Casa roubada, trancas à porta.” Em 1730, as autoridades ergueram o Forte de São João Baptista, à entrada do Porto Moniz, de maneira a que os barcos piratas não se pudessem sequer aproximar.
Inspirados pelo deleite gerado pelas Piscinas Velhas, pouco fãs de aquários e com o regresso ao Funchal pela frente, apostamos em mudar de freguesia.
A Enseada e Freguesia de Ribeira da Janela
Menos de dez minutos depois, serpenteamos no interior do vale profundo da Ribeira da Janela, famosa por ser a mais longa da Madeira, também pelos cenários vulcânicos dramáticos em redor da sua foz.
À medida que nos aproximamos do povoado, vemos uma torre de lava, distorcida e negra, destacar-se acima de vivendas de tons pastel, umas poucas, com telhados brancos e ocres, a formarem motivos.
Estacionamos, por ali, nas imediações da Central Hidroeléctrica que aproveita a força da ribeira.
Em pleno Estio, o caudal prova-se parco. Permite-nos saltitar de seixo em seixo, até à beira-mar.
E de regresso, até à escadaria e túnel que dão acesso aos Ilhéus emblemáticos da Ribeira da Janela:
o Ilhéu da Ruama. O Ilhéu Grande que ostenta o orifício epónimo em forma de Janela.
O Ilheuzinho. E a Baixinha, como o nome deixa perceber, uma amostra aos pés do monumental Ilhéu Grande.
Aventuramo-nos praia fora, com a bênção de Nª Srª, na figura de uma estatueta branca que os fiéis da paróquia mantêm num nicho magmático.
Logo, por um trilho resvaladiço, pouco acima das vagas atlânticas que faziam chacoalhar e ressoar os calhaus de basalto polido.
Aproximamo-nos e distanciamo-nos o possível. Em busca do melhor ângulo dos penedos, sobretudo, do fantasmagórico Ilhéu Grande. Só que se intensifica um vento de norte que faz as vagas galgarem quase até à base do trilho.
Extasiados com beleza crua, lávica e oceânica, da Ribeira da Janela e com a da imensa Costa Norte, rendemo-nos a uma já urgente retirada.
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